segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Balões

A rotina é um paradoxo. Durante a correria e a pressa das responsabilidades, não temos a delicadeza de olhar ninguém nos olhos e, por apenas um minuto, não procurar o próprio reflexo, mas tentar mergulhar na imensidão de outra alma.
Em calmaria, o vazio nos perde na solidão e medo dos mesmos ambientes corridos, tudo parece tranquilo, com uma assustadora beleza, mas esconde tudo que nossos olhos apressados não viram durante o expediente. O desespero, o medo, as mais terríveis atrocidades que ameaçam a vida ou impedem a morte.
Como um balão, que sem querer, escorrega da mão da criança e sobe sem rumo pelos céus. O choro se confunde com o som do trânsito parado, e apesar da beleza única daquele momento, o balão sobe com tantas incertezas, sem saber se aquela jornada terá um final feliz ou, mesmo que tenha, sem prever se o trajeto fará a chegada valer a pena.
A escolha não foi dele, combater a gravidade é, sem dúvida, um ato de coragem, mas e se chover? E se ventar? E se atravessar um grupo de pássaros? E se cruzar com um helicóptero ou passar por prédios com antenas pontiagudas? E se tudo que parecia ser um ato de honra e coragem não passar de uma tolice, uma estúpida decisão do acaso de o deixar voar, ser livre e desafiar o vento sem armas.
A beleza frágil daquele objeto se quebra na distração da rotina, a mesma rotina que separa nossos olhos, nossas almas e nos esvazia. O balão é carregado e se aterroriza às ordens do vento, tão preocupado em cair ou estourar, que não se permite apenas aproveitar a grande beleza ao redor.
Nós, guiados pelo tempo (ou a falta dele), ficamos a mercê de nós mesmos, tão confinados em nossas próprias ideias, que nem percebemos a grande beleza nos olhos daquela pessoa que, sem querer, esbarrou em você hoje na correria, e você, apenas, a xingou e seguiu com pressa.

21/09/2014

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